“Se Cristo é a cabeça da Igreja, o Espírito Santo é a sua alma”. Assim afirmava meu venerável predecessor Leão XIII na encíclica Divinum illud munus (1897: DZ 3.328). E depois dele, Pio XII explicitava: o Espírito Santo no corpo místico de Cristo é “o princípio de toda ação vital e verdadeiramente saudável em todas as partes do corpo místico” (Encíclica Mystici Corporis, 1943: DZ 3.808).
Hoje queremos refletir sobre o mistério do corpo de Cristo, que é a Igreja enquanto vivificada e animada pelo Espírito Santo. Depois do acontecimento de Pentecostes, o grupo que dá origem à Igreja muda profundamente: primeiro se tratava de um grupo fechado e parado, cujo número era de “uns cento e vinte” (At 1,15); logo se transformou em um grupo aberto e dinâmico ao qual depois do discurso de Pedro, “se uniram umas três mil pessoas” (At 2,41). A verdadeira novidade não é tanto este crescimento numérico, ainda que seja extraordinário, mas a presença do Espírito Santo.
Com efeito, para que exista a comunidade cristã não basta um grupo de pessoas. A Igreja nasce do Espírito do Senhor. Ela se apresenta - para utilizar uma feliz expressão do saudoso Cardeal Congar - “completamente elevada ao céu” (La Pentecoste, trad. ital., Brescia 1986, p. 60).
2. Este nascimento no Espírito, que teve lugar para toda a Igreja em Pentecostes, se renova para cada crente no batismo, quando somos mergulhados “em um só Espírito”, para ser enxertados “em um só corpo” (1Cor 12,13). Lemos em Santo Irineu: “Assim como a farinha não pode fazer, sem água, um só pão, tampouco nós, que somos muitos, podemos chegar a ser um em Cristo Jesus, sem a água que vem do céu” (Adv. haer. III, 17, 1). A água que vem do céu e transforma a água do batismo é o Espírito Santo. Santo Agostinho afirma: “O que nosso espírito, ou seja, nossa alma é para nossos membros, o mesmo é o Espírito Santo para os membros de Cristo, para o corpo de Cristo, que é a Igreja” (Serm. 267 4). O concílio ecumênico Vaticano II, na costituição dogmática sobre a Igreja, recorre a esta imagem, a desenvolve e lhe dá um sentido mais preciso: Cristo “nos deu seu Espírito, que é o único e o mesmo na cabeça e nos membros. Este de tal modo dá vida, unidade e movimento a todo o corpo que os santos Padres puderam comparar sua função à que realiza a alma, princípio de vida, no corpo humano” (Lumen gentium, 7). Esta relação do Espírito com a Igreja nos orienta para que a compreendamos sem cair nos dois erros opostos, que já a Mystici Corporis indicava: o naturalismo eclesiológico, que se detém unilateralmente no aspecto visível, chegando inclusive a considerar a Igreja como uma simples instituição humana; ou ainda, ao contrário, o misticismo eclesiológico, que se assentua a unidade da Igreja com Cristo, até o ponto de considerar Cristo e a Igreja como uma espécie de pessoa física.
Trata-se de dois erros que têm uma analogia, como indica Leão XIII na encíclica Satis cognitum, com duas heresias cristológicas: o nestorianismo que separava as duas naturezas de Cristo, e o monofisismo, que as confundia. O concílio Vaticano II nos proporcionou uma síntese, que nos ajuda a captar o verdadeiro sentido da unidade mística da Igreja, apresentando-a como “uma realidade complexa na qual estão unidos o elemento divino e o humano” (Lumen gentium, 8).
3. A presença do Espírito Santo na Igreja faz que ela, ainda que esteja marcada pelo pecado de seus membros, seja preservada do defeito. Com efeito, a santidade não só substitue o pecado, como o supera. Também neste sentido se pode dizer com São Paulo que onde abundou o pecado, superabundou à graça (cf. Roma 5,20). O Espírito Santo habita na Igreja, não como um hóspede que, portanto, é um estranho, mas como a alma que transforma a comunidade no “templo santo de Deus”. (1 Co 3, 17; cf. 6, 19; Ef 2, 21) e a assimila continuamente a si por meio de seu dom específico que é a caridade (cf. Rm 5, 5; Gl 5, 22).
A caridade nos ensina o concílio Vaticano II na constituição dogmática sobre a Igreja, “dirige todos os meios de santificação, lhes dá a sua forma e os leva ao seu fim” (Lumen gentium, 42). A caridade é o “coração” do corpo místico de Cristo. Como lemos na bela página autobiográfica de Santa Terezinha do Menino Jesus: “Compreendi que a Igreja tinha um corpo, composto por diversos membros, e não faltava o membro mais nobre e necessário. Comprrendi que a Igreja tinha um coração, um coração ardente de amor. Entendi que só o amor impuslsionava os membros da Igreja à ação e que, se fosse apagado este aor, os Apóstolos não haveriam anunciado o Evangelho, os mártires não teriam derramado seu sangue (…) compreendi que o amor abraça todas as vocações, que o amor é tudo, que se extende há todos os tempos e todos os lugares (…), em uma palavra, que o amor é eterno” (Manuscrito autobiográfico, B 3 v).
4. O Espírito que habita na Igreja mora também no coração de cada fiel: é o dulcis hospes animæ. Portanto, seguir um caminho de conversão e santificação pessoal significa deixar-se “guiar” pelo espírito (cf. Rm 8,14), permitir a Ele trabalhar, orar e amar em nós. “Fazer-nos santos” é possível, se nos deixamos santificar por aquele é o Santo, colaborando dócilmente em sua ação transformadora.
Por isso, [...] para o fortalecimento da fé e do testemunho dos cristãos, “é necessário suscitar em cada fiel um verdadeiro anseio de santidade, um forte desejo de conversão e de renovação pessoal em um clima de oração cada vez mais intensa e de solidária acolhida do próximo, especialmente do mais necessitado” (Tertio millennio adveniente, 42). Podemos considerar que o Espírito Santo é como a alma de nossa alma e, portanto, o segredo de nossa santificação. Permitamos que sua presença forte e discreta, íntima e transtormadora, habite em nós.
5.São Paulo nos ensina que a inhabitação do Espírito Santo em nós relacionada intimamente com a ressurreição de Jesus, é também o fundamento de nossa ressurreição final: “E se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vós, aquele que ressuscitou a Cristo dentre os mortos dará também a vida a vossos corpos mortais por seu Espírito que habita em vós” (Rm 8,11).
Na bem-aventurança eterna viveremos na alegre participação, que agora está prefigurada e antecipada pela Eucaristia. Então o Espírito fará amadurecer plenamente todas as sementes de comunhão de amor e de fraternidade que tenham florecido durante nossa peregrinação terrena. Como afirma São Gregório de Nissa, “envlvidos pela unidade do Espírito Santo, assim como pelo vínculo da paz, todos serão um só corpo e um só Espírito” (Hom 15 in Cant.).
PAZ E BEM A TODOS!!!!
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